terça-feira, 21 de abril de 2015

Filosofia e Ensino de Filosofia Hoje.





Introdução

Actualmente, a Filosofia é concebida como ‘bicho-de-sete-cabeças’ quase por muita gente, não porque não sabem o quê é Filosofia, mas sim, por ignorância pela disciplina. Como se fosse tão difícil de estudá-la e muito mais de ensiná-la. O tema ‘Filosofia e Ensino de Filosofia’ expõe o que é ensinável na filosofia e como transmitir o conhecimento desta disciplina, uma vez que, a filosofia tem a importantíssima tarefa de informação e formação do indivíduo.
O ensinável na filosofia são os conceitos com as regras de ‘como pensar’, pois a filosofia é uma reflexão individual e como reflexão autónoma, não se pode ensinar ao individuo ‘o quê pensar’, mas sim, ‘como pensar’, de modo que, o indivíduo goze sempre da sua autonomia e liberdade de pensar individualmente.
Recordemos as grandes pilastras da filosofia Kantiana segundo as quais, ‘não se pode ensinar a filosofia, mas sim, a filosofar’. Todavia, o próprio Kant se mostra contraditória ao afirmar que podemos ensinar a filosofia quando enquadrada num sistema escolar, mas não como doutrina acabada, mas sim, como um campo de saber que se faz através da liberdade de cada um.
Spinoza foi um filósofo que também por mérito tinha sido solicitado em Heidelberg para assumir o cargo de Cátedra para ensinar a filosofia naquela Universidade. Porém, Spinoza recusara o cargo justificando-se de que não teria a liberdade de investigação como amante do saber, visto que, ele estaria submisso as leis, as obrigações da instituição. Daí ele encontra a incompatibilidade entre a filosofia e o seu ensino, pois ensinar a filosofia é obedecer as leis da instituição, fechando assim, a liberdade de filosofar como uma actividade autónoma e individual.
No entanto, o ensinável na filosofia bem como ‘o que se avalia’ são as competências individuais dos alunos, e cada professor use o método adequado para o ensino segundo a realidade circundante.     



1.      Filosofia e Ensino de Filosofia (Sílvio Almirante[1])


Ao longo dos tempos, o ensino de Filosofia passou por uma série de modificações, desde a sua introdução. A problemática do ensino de filosofia torna-se tema de discussões, pois como pensar em direccionar a aplicabilidade desta disciplina, cujas suas raízes mais profundas, ela usa a reflexão e a análise crítica sobre os mais diversos problemas expostos pela História da Filosofia.
O ensino de filosofia deve levar em consideração que ela é um produto do pensamento, deve estar aberta ao diálogo e possibilitar uma postura crítica frente as discussões surgidas no processo de conhecimento.
Cerletti (2004) distingue três questões problemáticas sobre o ‘ensinar filosofia’: a delimitação de um campo teórico e contextual (a filosofia); o reconhecimento de uma actividade ou uma prática singular (filosofar); e por último a possibilidade de levar o outrem neste campo teórico e textual e de inicia-lo nesta prática (ensinar filosofia/a filosofar).
A filosofia como diálogo comunicativo torna-se difícil encontrar os caminhos da sua comunicação, este é o problema central da Didáctica de Filosofia, isto é, ‘pensar como se ensina a filosofia’. No entanto, nem todo o ensino de filosofia é filosófico, porque muitas vezes este é deculpado, pois corre-se o risco de se transformar o ensino de filosofia num conjunto de ideias que se transmite e que se recebe como herança, pelo uso excessivo da sua didactização, ou seja, transformação do ensino de filosofia num conjunto de estratégias que tornam em si mesmo num fim.

2.      O Ensinável da Filosofia (a dificuldade da questão)

Návia (2004) comenta sobre as dificuldades do ensino secundário da filosofia. Ressaltando as precárias condições materiais do ensino médio público, onde encontra-se turmas com excesso de alunos, falta de materiais didácticos, o baixo salário pago aos docentes, professores não formados em filosofia ministrando aulas de filosofia, no que se refere a questão ideológica e política as discussões sobre o assunto são muito superficiais ou quase não existem.   
A questão, se a filosofia é ensinável torna-se um paradoxo, uma vez que, a filosofia é saber instituído e legitimado curricularmente. A dificuldade de ‘como ensinar’ tende-se na própria natureza da filosofia, daí que o ensino de filosofia com questão de necessidade de esclarecimento do próprio conceito de filosofia.
Para afirmar-se que é possível ensinar a filosofia, deve-se definir o que vai ser ensinado. O ensinável em filosofia é os ‘conceitos em função das regras de como pensar’. Se considerarmos a filosofia como ‘um conjunto de doutrinas’ podemos afirmar que a filosofia é ensinável. Porém, se considerarmos a filosofia como ‘reflexão autónoma’, não se pode ensinar.
O ensino de filosofia difere de outras ciências através da sua exigência de demostração, racionalização e exposição, uma vez que, o ensino de filosofia deve estimular a coragem de pensar. O ensino de filosofia deve orientar o aluno ‘como deve pensar correctamente’ e não ‘o que deve pensar, ou seja, uma aula de filosofia deve colocar-se como uma verdadeira aprendizagem do exercício do pensar.
Segundo Danilo Marcondes “o grande desafio para o ensino da filosofia consiste em motivar aquele ainda não possui qualquer conhecimento do pensamento filosófico, ou sequer sabe para que serve a filosofia, a desenvolver o interesse por este pensamento, a compreender sua relevância e a vir a elaborar suas próprias questões” (MARCONDES, 2004: 64).
Uma aprendizagem de filosofia deve garantir ou produzir transferência de competências, daí a necessidade do aluno à aprender a pensar. Com o ensino de filosofia pretende-se que a partir das suas abordagens problemáticas a aprendizagem se processa de modo simultâneo ‘informativo e formativo’, visando a familiarização do aluno com os temas, a sua introdução no universo conceptual, domínio do vocabulário específico, enquadrando o aluno no jogo da linguagem e desenvolvendo assim, a capacidade cognitiva.
Gallo e Kohan (2000) descrevem três formas dominantes para o ensino da filosofia: um ensino baseado na história da filosofia (o ensino da filosofia é o ensino da história da filosofia... ensinar filosofia significa ensinar o que a história da filosofia produziu até hoje. Há duas formas: baseado nos filósofos (Heráclito, Platão, Descartes, Heidegger...) os conceitos os conteúdos filosóficos (liberdade, verdade, justiça...); a outra um ensino baseado em problemas filosóficos (em torno de problemas: relação corpo-mente, a existência de Deus o conhecimento); e a última um ensino baseado em habilidades cognitivas e o atitudes filosóficas (propiciar aos alunos um conjunto de habilidades de pensamento).
Gallo afirma que ensinar filosofia é um exercício de apelo a diversidade, ao perspectivismo; é um exercício de acesso a questões fundamentais para a existência humana; é um exercício de abertura ao risco, de busca de criatividade, de um pensamento sempre fresco; é um exercício da pergunta e da desconfiança da resposta fácil. Quem não estiver disposto a tais exercícios, dificilmente encontrará prazer e êxito nesta aventura que é ensinar filosofia, aprender filosofia (GALLO, 2002: 199).

3.      Filosofia versus Filosofar: Kant e o Ensino de Filosofia

Ensinar a filosofia para Kant, pressupõe a existência de uma área em questão, mas se não existe um problema eterno, então não se pode ensinar a filosofia, mas sim, a filosofar. Não se pode ensinar a filosofia segundo Kant, porque estaríamos a ensinar doutrinas, ou seja, assuntos acabados.
Para Kant o que se ensina é a filosofar. Todavia, nem tudo o que é da filosofia é ensinável, podemos instituir um ensino de filosofia, poi existe um aspecto como os ‘conceitos’. Segundo Kant, pretende-se que a partir dos ‘conceitos’ o aluno produza conhecimentos, isto como tentativa de suscitar no aluno o espirito de pensar.
Kant encontra na filosofia duas funções: Arquitectónica (Edificante) e Crítica. Segundo Kant quando estivermos na função Arquitectónica podemos ensinar a filosofia. A missão da função arquitectónica é a de construir ou edificar um sistema de ensino, o que quer dizer podemos dar um espaço para o ensino de filosofia. Quando estivermos na função Crítica diz Kant, não se pode ensinar a filosofia, mas sim, a filosofar (MARNOTO, 1989).
Kant ao dar a possibilidade de ensinar a filosofia é num ‘sistema escolar’, onde é um espaço que cria condições para o aluno reflectir. Nesta vertente, nota-se a aquisição de determinadas habilidades e capacidades.

4.      Spinoza e o Ensino de Filosofia

Na problemática sobre o ensino da filosofia à quando ao convite a uma Cátedra do ensino de Filosofia em 19673 na Academia de Heidelberg, Spinoza entende que há ‘incompatibilidade entre a actividade de investigação filosófica e a de ensino da filosofia em instituições escolares publicas universitárias’, admitindo assim, um conjunto de causas para esta justificação (Idem, 13):
·      A natureza dessas instituições: como qualquer instituição social, a universidade implica obediência cega e coerção; as Escolas, as Universidades fundadas ao custo do Estado não são tao vocacionadas para o ‘cultivo de espirito’, mas sim, para a coerção de modo a não perturbar a religião ou doutrina estabelecida publicamente.
·      As exigências da actividade de investigação filosófica: a filosofia sendo caracterizada pela ‘liberdade do filosofar’, deve ser garantida por uma vida retirada e solitária. A filosofia é uma actividade essencialmente solitária e o ensino é público, o filosofar implica tranquilidade e o ensino suscita e desenvolve polémica.
·      Ensino de filosofia e o Auditório Real: segundo Spinoza ensinar a filosofia ‘é desvirtuar a actividade reflexiva’, comprometendo o seu caracter monológico; ensinar a filosofia é ‘abandonar a perseguição solitária da verdade’, atendendo assim, ‘a natureza do auditório real’ a que o discurso filosófico se dirige, tendo em conta os seus condicionamentos, limites e a forma mais grave é deixar-se modelar por eles.
Na escrita afirma Spinoza que o filósofo é livre de determinar o texto como quiser, impondo-lhe o seu próprio ritmo, construindo-o a partir das exigências de desenvolvimento da verdade, dirigindo-o a um ‘auditório não real’ (com alunos com maiores limitações), mas sim, ‘ideal’ de sujeitos especialistas ou não, mas dotados de uma racionalidade limpa. Porém, numa aula de filosofia é dado o filósofo uma tarefa que o obriga a procurar adaptar o seu discurso aos limites e as imperfeições do auditório concreto a que se dirige. 
Partindo de uma caracterização das limitações do auditório real a que se dirige o ensino de filosofia, segundo Spinoza ‘é possível’, pois ensinar a filosofia implica uma cedência, uma contaminação do discurso filosófico pelas exigências didácticas de adaptação aos limites e as imperfeições de um auditor particular que muitos professores de filosofia se debatem com o seguinte problema/dilema: ou fazer-se entender pelo auditório sempre imperfeito dos seus alunos e, então, necessariamente ter que distorcer, passar por cima, esquecer uma palavra, enfim, trair a filosofia; ou então não trair a filosofia e aceitar poder não ser entendido.

5.      Filosofia e Formação de Professores

A implementação da disciplina de filosofia nos currículos das escolas de ensino médio e a sua manutenção onde ela já existe é fundamental para a permanência dos cursos de licenciatura em filosofia. No entanto, a presença da disciplina de filosofia no ensino médio se justiça pela importância para a formação dos jovens que frequentam este nível de ensino.
Quanto a formação dos futuros professores de filosofia, dado da discussão e solução dessa questão depende ‘dos próprios cursos de licenciatura em filosofia’ (GALLINA, s/ano: 455). Daí que encontramos dois problemas equacionados, a saber, um externo (relacionado com a valorização destes cursos) e outro interno, referente às concepções sobre as actividades desenvolvidas na formação dos professores de filosofia para o ensino médio.
O problema externo diz respeito ao modo como são tratadas as questões educacionais no nosso país, não obstante das publicidades indicarem maior preocupação com a educação, basta apenas verificar a forma como são tratados os professores dos diversos níveis de ensino em nosso país, de modo a se ter uma ideia real do valor que é atribuído a educação (GALLINA, s/ano: 456).       
O Estado e os órgãos de fomento para com a educação estão numa situação de descanso à pesquisa e à produção tecnológica, que direccionam os cursos de graduação para ‘a formação científica e para o ingresso nos cursos de pós-graduação’. Devido a certas medidas definidas por estes órgãos de fomento, os cursos de licenciatura têm tido grandes dificuldades em se manterem como cursos de formação de professores, uma vez que, tais órgãos de fomento estabelecem e fazem com que os projectos de pesquisas das licenciaturas, pouco têm a ver com à pesquisa voltada ao ensino de filosofia e à formação de professores para o ensino da filosofia no ensino médio.
O problema interno está relacionado à própria definição do que consiste um curso de licenciatura em filosofia e consequentemente, a sua solução passa pela participação e engajamento dos professores num debate sobre a natureza e o papel pedagógico destes cursos e sobre em que consiste a formação dos futuros professores em filosofia.
Uma concepção muito comum nos cursos de licenciatura é a que enfatiza que a formação de professores é uma actividade de transmissão de conhecimentos e de métodos de ensino, centrada na competência do professor. Não obstante a importância da figura do professor na actividade pedagógica, o que parece ser um ponto positivo, o problema com esta concepção é que nela existe o sucesso da formação está directamente relacionado com a capacidade de dominar e compreender os conteúdos a serem ministrados. Portanto, o fundamental para esta concepção é a competência técnica do professor, especificamente a sua capacidade de reter e transmitir os elementos considerados por ele como necessários para o desempenho das actividades em sala de aula.
É importante observar que as Universidades estão mais preocupados em ‘como formar estudantes que estejam preparados para serem bons pesquisadores e para ingressarem bons cursos de pós-graduação’ do que ‘formar bons professores para o ensino médio’ (Idem: 459).










Conclusão

Os filósofos juntamente com os pedagogos recomendam que se pare de olhar a filosofia e qualquer outra disciplina como difíceis de encarar ou estudar. Evitemos de levar ‘preconceitos’ para a sala de sobre qualquer disciplina fora dos benefícios da mesma para a sociedade. A filosofia é saber instituído curricularmente, cuja sem uma pequena bagagem da mesma você como humano devia sentir-se mal, buscando assim, a investigação desta disciplina.

O ensino de filosofia actualmente parece deculpado, porque em algumas vezes, ensina-se ‘A História de Filosofia’. Este facto contribui-se pela falta de professores formados em filosofia pedagogicamente, de modo que, se produza na sala de aula novos conceitos e transforando assim a turma de filosofia em um laboratório conceptual.

Em forma de sugestão, o Ministério da Educação deve introduzir nos ‘Centros de Formação de Professores’ a disciplina de modo que haja mais professores desta área, facilitando a sua introdução no nível básico (8ª, 9ª e 10ª classes), mas não introduzindo numa província apenas, deve ser em todas províncias.                                  

               










Bibliografia    

CERLETTI, A. Ensinar filosofia: da pergunta filosófica à proposta metodológica. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
GALLINA, Simone Freitas da Silva. Formação de Professores: a filosofia e o ensino médio. Centro Educação, Universidade Federal de Santa Maria, s/ano.     
GALLO, Sílvio. A especificidade do ensino de filosofia em torno dos conceitos. Ijuí: Editora Unijuí, 2002.
GALLO, Sílvio. & KOHAN, W. Crítica de alguns lugares-comuns ao se pensar a filosofia no ensino médio. Petrópolis: Editora Vozes, 2000.
MARCONDES, Danilo. É possível ensinar a filosofia? E se possível como? Filosofia: caminhos param o seu ensino. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.  
NÁVIA, R. Ensino médio de filosofia nas presentes condições culturais e sociais de nossos países. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.         
                
                                          

          
   


[1] Estudante do curso de Licenciatura em Ensino de Filosofia com Habilitações em História, na Universidade Pedagógica, delegação de Nampula, 4º Ano, 2015.

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